terça-feira, 24 de janeiro de 2012

SP458

Fiquei sabendo que desde bebê vim para São Paulo algumas vezes com meus
pais em busca de alguma cirurgia para minha retina. Ainda que o único
resultado tenha sido um diagnóstico, a cidade sempre exerceu algum
facínio sobre mim. Quando eu era criança, meus primeiros contatos com a
"selva de pedras" se deram pelas palavras de algum locutor. Nos dias
chuvosos na praia, enquanto todos jogavam baralho ou liam o jornal
naquela "sonífera ilha", a minha distração era acompanhar, nas ondas
curtas do radinho de pilha, o trânsito e a programação intensas da
metrópole. Talvez naqueles dias eu tenha ouvido falar do Elevado Costa e
Silva (Minhocão) e do Teatro Gazeta mais que da XV de Novembro e do
Teatro Guaíra. Anos mais tarde lá estive de passagem - indo para o
Hopihari com a escola ou para um evento no Rio, e fiquei vidrado na
quantidade de estações de rádio que meu walkman era capaz de sintonizar.
Pregação evangélica, música eletrônica, mpb, sertanejo, noticiário, o
locutor que saudava os trabalhadores que já estavam em pé antes das 6 da
manhã de um sábado qualquer. No caminho para o colégio, eu pedia pra mãe
sintonizar na Jovem Pan, só pra ouvir o "vambora vambora" do Jornal da
Manhã. "são seis e vinte e dois. Repita! São seis e vinte e dois. Na
paulista, quinze graus." E, quando me dou conta, já é o quarto
aniversário de São Paulo que passo na cidade - não como breve visitante,
e sim como morador. Ouvindo Ira ("feliz aniversário, envelheço na
cidade", resolvi escrever esse texto. Sem mais, vambora vambora! São
Paulo, lugar em que se aprende a admirar a beleza do caos. A cidade que
não dorme: pelo barulho, pelas baldeações entre trem, ônibus e metrô
antes e depois do expediente, pelas opções 24h. a metrópole do mundo, do
trabalho e da noite de todos. Tantos são os encontros e desencontros
entre seus quase 11 milhões de habitantes (20 milhões somando-se a
região metropolitana), formando a 4ª maior aglomeração urbana do
planeta. Distribuidos irregularmente em seus 1525km2, ocupam-se viadutos
pichados, praças mijadas, limpas calçadas arborizadas, arranha-céus
neoclássicos, cortiços, sobrados, mansões. A maior parada LGBT e a
segunda maior frota de helicópteros do mundo. Cidade de contrastes: a
Ponte Estaiada, o trabalho escravo no Bom Retiro. Há nem 3km do centro
financeiro do país, o golpe do bilhete premiado ainda rola solto na
Praça da Sé. Quantos quilômetros separam a Estação Tiradentes de Cidade
Tiradentes? Quantos ônibus chegam na Rodoviária do Tietê diariamente?
Quem nunca veio para cá visitar um parente, prestar uma prova, feira ou
congresso? Os que já viram e babaram na tv olhando o pastel do Mercado
Municipal, os que pensam em um dia criar coragem para correr na São
Silvestre. Os bares da Vila Madalena, os modernetes da Augusta, as
boates da Vila Olímpia, os botecos de cada esquina - aqui se ganha, aqui
se gasta. Restaurantes a se perder de vista - na Mooca, no Itaim ou na
Bela vista. Os alagamentos de janeiro e os engarrafamentos do resto do
ano são acompanhados por todo o país - nas telinhas, nos rádios dos
taxistas. A virada cultural, a mostra de cinema, as peças em cartaz que
lembram um festival de 365 dias. Oportunidade, diversidade, megalomania
e vaidade, o que mais define essa cidade? Aqui quem quer se acha, quem
quer se perde. Aqui quem chega não volta, quem parte compara: o chope
bem tirado, a pizza consistente, o metrô que espreme mas não demora a
passar. Ah São Paulo, difícil mesmo é não te gostar. Avesso do avesso,
túmulo do samba? Fique de boa na garoa, legal na marginal - aqui tem
dias de sol, azaração e até carnaval. Sampa é porreta, maneiro, massa ou
trilegal, mas faz parte de nosso povo daqui falar mal. Dizem não caber
num adjetivo qualquer, não ter uma identidade - mas eu não a troco tão
cedo por qualquer outra cidade. Parabéns a todos que fizeram e a nós que
hoje fazemos desse o nosso lugar!

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