sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Lendo com asõrelhas e mãos

Domingo bom é aquele em que acordo quando o sono acaba. Olho no celular as
mensagens ouchamadas não atendidas, porque deixei o aparelho no silencioso. Dou
uma longa espreguiçada, com direito a um bocejo nada discreto. Tomo um banho
ouvindo rádio e, ainda enrolado na toalha, começo a ler o jornal enquanto dou
uma passada pelos e-mails, tweets e leio a previsão do tempo. E, num piscar de
orelhas, o tempo voou mais rápido que a voz do meu etezinho ledor. Começo a
pensar se minha saída seria para um almoço tardio ou janta fora de hora.
Respondo alguns e-mails que já faziam aniversário, mais uma olhada nas frases
engraçadas e vídeos indicados no facebook. Só quando a cabeça cansa de ouvir a
voz mecânica é que boto uma roupa e resolvo subir ladeira. E que voz é essa? É o
leitor de telas, programa que transforma em voz sintetizada o que está escrito
na tela e também o que digito. É assim que consigo escrever esse texto, ler o
jornal, consultar o sistema e fazer as portarias no trabalho, responder e-mails
e perder a noção do tempo no msn ou no youtube. No caso do jornal, por exemplo,
entro no site e, quando acho algum link de notícia que me interessa (navegando
com a tecla tab), dou um enter e ele despara a ler.
Além do computador, existe também o braille, aquele monte de bolinhas que muita
gente pensa ser difícil de entender. O sistema de leitura para cegos,
desenvolvido pelo francês Luis Braille a partir de um código para comunicação
nos campos de batalha, foi essencial na minha alfabetização e na vida escolar.
Trata-se de uma sélula com 3 pontos de altura por 2 de largura - da combinação
desses 6, são possíveis 63 arranjos diferentes. Vale uma pesquisada no Google
por "fonte braille". Até hoje etiqueto meus dvds em braille, consigo identificar
congelados, remédios e outros produtos, caso o fabricante tenha se tocado de que
é um diferencial (não só do ponto de vista inclusivo, como mercadológico). Assim
é que os pontinhos não devem ser esquecidos mesmo para os cegos que nascerão
sabendo o que é USB.
Voltando ao computador, são 2 os softwares que utilizo: o Dosvox e o Jaws. Há
uma demonstração de uma voz sintetizada em bit.ly/loquendo (selecionar o Felipe,
a Fernanda ou a Gabriela, que são as portuguesas). Já quanto ao teclado,
frequentemente me perguntam se o meu tem braille nas teclas. Acho que isso até
deve existir, mas não é algo necessário - não só porque o programa pode soletrar
tudo o que digito, mas também porque existem referenciais bastante práticos.
Repare as marquinhas em relevo nas letras F e J de seu teclado, bem como no 5 do
teclado numérico. Achando isso, se você já tiver uma noção do teclado, fica
fácil encontrar o d (à esquerda do f), ou o 2 (abaixo do 5). Isso é um padrão da
ABNT, e é especialmente útil, por exemplo, em telefones e maquininhas de cartão
de débito e crédito. Certa vez, impressionada com a velocidade com que digitei
minha senha na tal maquininha,
 tentei explicar à balconista esse lance da bolinha no 5, que era facilmente
encontrado pela marcação, e ela me perguntou se minhas senhas eram então sempre
seqüencias de números 5, risos.
a voz sintetizada tem uma aplicação não só restrita ao computador. Graças a ela
há mais de 5 anos não preciso de alguém para ler meus sms no celular. Com um
fone de ouvido plugado no caixa eletrônico, posso fazer um saque e ele me diz as
notas que a máquina liberou. Quanto a saber diferenciá-las, talvez isso mereça
um capítulo a parte, na semana que vem ou na outra. E falando em capítulos,
passei algumas madrugadas digitalizando partes de livros para a faculdade.
Deve-se passar
 página por página no scanner (com sorte, a depender do tamanho do livro, da pra
abrir e passar duas). Depois o programa faz um "ocr" (reconhecimento da imagem
gerada para texto) e aí é só botar o leitor para tagarelar. Acontece que esse é
um trabalho chato e demorado, que poderia ser poupado se as editoras tivessem a
descência de fornecer os livros já em formato digital. Como disse uma vez meu
amigo Diniz, scannear é imprimir do avesso! Mas, para quem há alguns anos ficava
entediado na praia em dia de chuva, enquanto todo mundo lia o jornal ou jogava
baralho, as tecnologias assistivas hoje são música, informação, literatura e
arte para meus ouvidos!

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