segunda-feira, 4 de julho de 2011

Viagem ao Centro do Rio

No último sábado, 02/07,  fez 3 anos que moro nessa babilônia chamada São Paulo.
Passada a empolgação inicial, em que eu tomava um porre comemorativo a cada dia
2, comecei a bebemorar a data anualmente. Ano passado teve via sacra dos bares
da República, minha "morada inicial", ao Baixo Augusta.
Esse ano pensei em algo diferente, e ele veio em uma madrugada de junho.
Passagem promocional, Congonhas Santos Dumont. A tarifa só tava disponível para
compra até as 6 da manhã, dificilmente encontraria alguém que curtiria o aviso
em horário tão inoportuno.
Alguns meses antes fui ao Rio com amigos aqui de Sp. Alimentei meu banco de
dados fazendo todas as perguntas sobre ruas possíveis. Percebi que não era nada
difícil bengalear pelas quadras da princesinha do mar. Ainda assim, faltava
conhecer a Lapa. Mas "eu comigo mesmo"?
Horas antes de partir boto aviso no Facebook e no Twitter, avisando de minha
chegada. Tenho alguns conhecidos da cegolãndia na cidade, mas se mal consigo
manter contato com alguns amigos daqui, imagine o quanto sou relapso com os de
outras bandas.
Entro num site com a programação da Lapa e o destaque era Teresa Cristina, há
poucas quadras do hotel em que me hospedaria.
Mas eu não sabia se ainda tinha ingresso, ou se éra só couvert. Não precisei me
preocupar com isso, porque ninguém atendia o telefone e o vôo atrasou.
Ademais, eu queria mesmo é ficar na rua, como faço na Augusta - aí dá pra sentir
o clima e não preciso ter vergonha de ser feliz. Não tem ingresso e o garçom não
vai fazer aquela pergunta clássica: tá sozinho??
Tudo bem, ainda não era meia noite e, já sem o peso da mochila nas costas,
decidi partir em busca de uma gelada ali por perto.
Era praticamente uma noite de verão - que alegria usar camiseta em julho. O
mesmo casal que me ajuda a atravessar a primeira esquina me leva até a Gomes
Freire, onde começava a muvuca. Compro uma latinha e fico ali na calçada, de
"ouvidos bem abridos"!
Pedi uma Brahma, porque achei que seria "forrçar" de maixno sotaque mandar ver numa "xkol"!
Não tardou para alguém esbarrar em mim (Rodrigo?), pedir desculpas e o papo
fluiu mais rápido que minha sede.
- Pô merrmão, tu tá tomando Brahma, isso é coisa de paulichta!
- Aí, é merrmo. Devia ter pedido uma Itaipava, aí também não tinha erro..
Valeu Paulete, Xan, Rodrigão e todos os outros cujos nomes minha memória não foi
suficientemente precisa para resgatar, mas estão registradas como um vídeo feito
 de sons, risadas, improvisações e cevadas, numa imagem pra lá de perfeita. Com
a ajuda do Facebook ou do acaso, espero revê-los ben breve!
Não é preciso andar de bondinho ou pisar nos arcos pra entender o que é a Lapa:
uma Augusta com samba, um clima de última sexta-feira do ano.
Propositalmente perco o horário do café. Tomo um banho demorado, ajeito alguns
cacarecos na mochila e parto em direção ao Lapamaki, já com o pedido em mente:
corcovado (salmão com cebolinha). Esse Google realmente é praticamente um olho.
Por ali mesmo pego o 464.
e
Durante o trajeto, novamente de "ouvidos bem abridos", presto atenção na
conversa de um casal, que segue rumo ao Metrô Cantagalo. Dirigindo o "olhar" pra
eles, pergunto se tá longe da Barata Ribeiro.
- Você vai descer onde?
- Acho que perto de vcs, próximo à Cantagalo.
- Beleza merrmão, vamos descer lá também, te aviso..
(que coincidência ou que surpresa, risos)
Nem meia hora depois desembarco em Copacabana. E aí é que percebi que aumentar e
diminuir o número da rua no Google Maps, pra descobrir as transversais,
realmente ajuda, mas nada como um par de olhos - e no Rio eles são ainda mais
atentos.
Na recepção uma simpática moça, do Rio (Grande do Sul), mas com sotaque neutro.
Era a primeira vez em que eu me hospedava em um hostel. Decidi então entrar de
cabeça: escolhi o quarto Maracanã, com 7 beliches. Será que seria fácil achar a
cama? E o banheiro? E à noite, se eu chegasse muito "fora de mim", o quarto
pareceria ter 14 beliches?
Prema, a gaúcha que eu quase chamava de Prenda, foi uma ótima guia. Me descolou
uma cama em baixo, mostrou o locker, o banheiro.
Quando eu liquidava com o último naco de salmão dos dentes me aparece o André,
um portuga aventureiro que também tava sozinho. Foi com ele que fui andando até
Ipanema, onde tomamos "um bucado" de cerveja.
De volta ao hostel ele pergunta ao rapaz da recepção sobre bailes funk - mas não
o indicado na recepção, e sim um "de vrdad". Eu já me contentei com a festa open
bar, que seria no Pub do próprio hostel.
O que eu não imaginava é que, horas mais tarde, entraria lá (no Pub, e não na
Rocinha) na faixa.
Como um X Tudo no pé sujo ao lado, sigo em direção à Atlantica e, no meio do
caminho, um boteco tocando Chico. Paro pra ouvir e uma moça já pergunta se eu
preciso de alguma coisa. Falo que apenas parei pra ouvir a música e já me
convidam a puxar uma cadeira. Talvez pelo nada simpático preço dos imóveis em
Copacabana, residem muitos idosos naquela área - por terem uma vida estabilizada
ou serem imóveis adquiridos a muito tempo, suponho. E eles me parecem tão de bem
com a vida, ouvindo Chico, fumando um cigarro, tomando whisky ou guaraná. Será
que quando eu crescer vou pra lá?
Novamente de volta ao Hostel escovo os dentes e beberico uma latinha de
energético, o quarto quase vazio. Um rapaz de maceió, que mora em Osasco, puxa
papo e descubro que ele aguarda chamada no mesmo concurso em que fui nomeado.
Enquanto isso o batidão rolava solto lá embaixo e o domingo já se avizinhava.
Costumo ser bastante extrovertido, mas nem por isso tenho controle sobre uma
certa timidez que toma conta de mim ao entrar sozinho em alguns lugares como
restaurantes e bares fechados. A rua é um espaço de todos e, se alguém demonstra
alguma preocupação sobrenatural por um "doido das vista prejudicada" estar ali
sem cão e sem nenhum outro vivente, facilmente contorno tal situação falando que
sei onde estou, seguido de algum outro clichê ou piada improvisada. Já num
ambiente tipo boate a locomoção fica totalmente prejudicada, porque os "ouvidos
abridos" só captam a batida. Pessoas se confundem com paredes, as conversas são
sempre em tom de quem te pergunta se vai atravessar a rua lá do outro lado da
avenida (aos berros). E num ambiente tão "hostil" parece ainda mais fora da
realidade terrena que algum cego esteja desacompanhado. Daí minha preferência
pela sarjeta e seus botecos.
Nem por isso deixo de apreciar um som capaz de fazer vibrar o último
fio da meia e me divertir com as conversas empolgadas dos que prometem te
levar pra 1001 lugares, contam casos, vantagens e, conforme avança o horário,
desilusões e pensamentos revolucionários.
Saio pra respirar e, pensando se  toco um foda-se pra minha timidez e vou à
procura da batida quase perfeita
ou arrisco passar a noite zanzando por aí em busca de boa prosa etílica, o
hostes da festa me cumprimenta e, depois de algumas palavras, me diz que eu
seria "vip" (quando talvez tudo o que eu esperava ouvir era um "vê com os teus
camaradas aí e cola aqui"). Aí foi difícil resistir - mais pela gentileza no
convite que pelo
tutu economizado - até por que as vezes o $ só te abre portas se quem tem a
chave se sente seguro para abrí-las.
E assim foi minha segunda noite carioca: bebericando lentamente e, quando a
música era conhecida, botando pra quebrar no tímido estilo robozinho, até
aparecer alguém e ditar as instruções: balança o ombro, assim com a cabeça..
Mais saídas pra respirar e lá fora conheço outros grupos. Contatos no facebook,
histórias, risadas, perguntas.
Não foi difícil achar a cama, sem antes dar aquela demorada escovada de dentes
num banheiro coletivo vazio. Deitei sorrindo, talvez por isso tenha acordado com
a boca levemente seca e faminta, já que minha preguiça e minha timidez
em pedir ajuda para fazer um pão me
fizeram perder o café e partir em busca de águas já conhecidas de outros
carnavais: Galeto do Miguel, na Miguel Lemos.
Durante o trajeto pedi informação pra um rapaz que me ajudou a atravessar a rua.
Ele disse não saber, era paulista e não conhecia muita coisa -  mas dessa vez o Google Maps tinha
razão.
Faço o pedido ao garçom e a moça já pede pra carne vir "à francesa" (já
cortadinha). Na hora de acertar a conta, algo quase engraçado:
- Moço, você tem que ir à esquerda.
- Mas a Djalma Ulrich não é pra cá?
- Você não tá no Othon?
- Não, tô no Hostel!
Falando em Ulrich, de início eu só falava "Rua Djalma...", até descobrir a
pronuncia. É porque no dia anterior eu falei que queria ir na Lavrádio, e aí me
perguntaram se não era a  Lavradiu (é não, Paulete? risos)
Fora o hotel na Lapa, que saí sem saber se era "Rio's Nice" ou "nisse" merrmo.
Barriga cheia, volto para o hostel e fico um tempão conversando com a Prema, a
simpática gaúcha da recepção. Chegava a hora de ela ir embora, a minha também
não demoraria. No Pub agora vazio assisti ao 1º jogo da seleção, foi de dar
sono.
Volto à recepção, escuto inglês, espanhol e carioquês. Logo chega o André, o
purtuga, e vamos ao Mc.
- "queres que met katchup"?
Acho que ele sequer me perguntou isso, mas fiquei com essa frase na cabeça.
Realmente 9000 quilômetros fazem a diferença nesse nosso idioma
transfronteiriço. Melhor ainda foi o "estou cheio de fome".
Gente boa também vc, André!
Sentirei saudades de todos, inclusive dos que não me recordo os nomes (os rostos
então, nem pensar, risos).
Desembarco em Congonhas e o ônibus Perdises não demorou a passar. Desço na
Paulista e, batendo o bastão freneticamente, conheço cada poste, árvore ou
orelhão da ladeira que me leva até em casa. No meio do caminho o sãopaulino dono
de um dos bares da GV me pede pra contar pros corinthianos da mesa aquelas
piadinhas do último  chocolate que o timão deu nos pó de arroz.
Segunda-feira gelada, diz até que garoa. Que os novos forasteiros te possam curtir
numa boa, porque eu já sou quase de casa.
Escrevo no presente, depois no passado, e já penso que num futuro próximo quero
desbravar ainda mais o mosaico daquele calçadão, ou as travessas da rua que corta a
Paulista, entre Frei Caneca e Haddock Lobo.
Sou verde e rosa, sou saracura do Bixiga. Aqui toca Tom Zé, toca Teresa
Cristina. E esse fim de semana que já dura 3 anos tá "mó da ora de maneiro"!

2 comentários:

  1. Legal conhecer um outro ponto de vista, composto por sensações tão distintas.
    E se o senhor é tímido, não sei o que eu sou...
    Feliz por te conhecer.
    beijos,
    Cássia

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  2. Mas é verdade, uai! Espero ter te respondido com a última postagem (criando
    coragem). Também feliz por conhecer pessoas como você - acho até que a ausência
    de visão me faz passar por situações que propiciam isso. Então ficamos assim:
    diz aí que eu "ouvo" aqui, penso e, se pintar algo a dizer, vira postagem ou
    lembrança pra mais tarde. Bjs

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