domingo, 15 de setembro de 2013

Um apagão de 4 noites e 2 dias

Os semáforos ensimesmados, a repetir uma única cor apagada.
Alguns corpos foram necessários pra entender que o melhor era deixar o carro em
casa - a pressa também se apagou.
As geladeiras apodreciam, velas e isqueiros vasculhavam os escombros. O mendigo
já tava acostumado com a comida passada, mas à noite era sem alarmes. Tomava-se
cerveja quente nos bares, brindava-se a suspensão do expediente por falta de
computadores com nobreak. Nos restaurantes, muitos apressados comiam
literalmente cru. Cegos corriam pelas avenidas do centro, desertas de latas
móveis e tomadas de gente, vendendo pilhas. Aquele cubinho dotado de energia
começou a valer muitos dinheiros, ainda mais quando o cartão, na falta da
maquineta, passou a ser só um plástico numerado. Filas se formavam nos orelhões,
pra dizer que tava tudo bem e que, apesar dos pesares, tava tudo bom. À noite
alguns bancos que ficaram sem fardados de lanterna foram saqueados, mas os novos
ricos logo se iluminavam de mais e eram capturados em pleno breu. Nas primeiras
horas, vizinhos se encontravam constrangidos para o banho com senha, já que nos
andares mais altos a água só chegava por bombeamento (e olha que subir todas
aquelas escadas já era motivo pra uma boa chuveirada). Não demorou pra síndica
escrever 200 bilhetes a mão e convocar uma reunião de emergência, a fim de
estipular os horários de banho e a repartição de alimentos em bom estado -
muitos tanto se animaram com a idéia que até começaram suas ortinhas.
Numa dessas infindáveis noites, na fila da ducha, um vivente simpatizou com
outro e se solidarizou com a subida até o 20º caixote; acabaram dormindo de
conchinha no quinto. E de repente vários rádios e televisores gritavam ao mesmo
tempo, celulares voltavam a vibrar e emitir seus grunhidos. No radinho de pilha,
a mesma informação da telinha: já tinha metrô circulando. A luz voltou, já era
amanhã.

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